sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Pretinho Básico


Dias atrás fui fazer a cobertura jornalística de um evento e fiquei surpresa com minha atitude após perceber que num público de 150 pessoas mais ou menos, 90% estava de preto: os apresentadores, os recebedores dos prêmios e diplomas, inclusive, adolescentes, o pessoal do serviço de buffet, e eu..., de terninho verde e apetrechos voltados para o creme; estava muito bem vestida para a ocasião. Mas, como eu sempre uso preto em solenidades, e também fora delas - inclusive em funerais de quem quer que seja, me senti surpreendentemente inadequada. Um absurdo, pois, a minha roupa estava propícia à ocasião!!! Mas era como se eu não estivesse bem, embora estivesse muito bem, sim.

Intrigada (e surpresa) com a situação, comecei a vasculhar a origem do popular "pretinho básico" que de básico não tem nada, mas é puro glamour e levei um susto. Eu pensava que o têrmo fosse moderno, criado no final do século XX mas não é. Há quase um século que ele se tornou o melhor amigo da mulher, e ao longo desses anos não há quem não resista a ele, inclusive homens e adolescentes, como percebi na cerimônia mencionada.
O cinema teve grande influência na moda através do século, desde sua estréia em 1929, quando contratava grandes estilistas, como por exemplo, Coco Chanel, para desenhar os figurinos dos personagens. E ela, além de ter reinventado o terninho feminino não poderia passar sem este acréscimo de bom gosto: criar o preto - no crepe, no veludo, no linho, na seda, na malha. Nascia o pretinho básico, deixando as mulheres gratas para sempre. O croqui (era dela) do vestido reto, simplérrimo, saia pouco abaixo do joelho, todo preto com um debrum branco e preto no punho, que a revista Vogue publicou em 1926 com uma muito acertada previsão: "Vai se tornar o uniforme de toda mulher de bom gosto".

O preto, que antes era de uso exclusivo de senhoras em velórios, de luto e festas de gala, ganhou a manhã, a tarde e a noite, ou, qualquer momento em que a mulher precisasse estar "bem" em determinadas ocasiões. Apesar do diminutivo consagrado, pretinho básico hoje é qualquer idéia infalivelmente certa para a ocasião em que for usada. Vale tudo: vestido, tailleur, longo, terninho, mini, até macacão. E todas as mulheres conseguem ficar fabulosas e espetaculares no tal pretinho. Ele trouxe para o universo feminino junto com a simplicidade, a materialização da mais pura elegância. Preto é puro - e elegância, como Chanel ensinava “tem muito mais a ver com expurgar detalhes do que com acrescentá-los”. Detalhe: ela era baixinha e se considerava feia, mas vestida de preto (com pérolas, seu par perfeito) ganhava uma distinção incomum.

E assim foi o avanço do vestido preto, de mulher em mulher, de beldade em beldade, de dona-de-casa em dona-de-casa, até se firmar definitivamente em seu pedestal de glória no dia em que Audrey Hepburn, adorável e elegante em seu corpo esguio, apareceu no filme Bonequinha de Luxo, com luvas, franjinha e vários e inesquecíveis outros pretinhos, desta vez, desenhados por Givenchy. Temos outros nomes como o de Rita Hayworth, encarnando Gilda com seu lindo e famoso vestido preto drapeado - obra do estilista Jean Louis, num strip-tease que nunca aconteceu, e, apenas uma única luva foi tudo o que ela tirou. Jackeline Kennedy, considerada a mulher mais elegante do século XX, que usava poucos, mas inesquecíveis modelos pretos, deixou gravada na história uma imagem de tragédia quando vestida de tailler preto e véu de viúva sobre o rosto, foi ao enterro do marido John, em 1963, levando pelas mãos os dois filhos pequenos. Além das qualidades citadas, o pretinho também é funcional. Esconde manchas, disfarça amassados, e o melhor dos melhores, emagrece e facilita a combinação: preto vai com preto, vai com branco e ponto. É provado que num pretinho com bom corte, as mulheres "mais substanciosas" podem se sentir belas, esbeltas e poderosas, praticamente uma dama. É fato: desde sua invenção, nos anos 20, o pretinho básico se mostrou perfeito para a nova mulher que surgia. Ele se instalou no dia-a-dia das mulheres que deu lugar ao inimaginável e continua sendo uma peça básica do guarda-roupa feminino, desde os anos 90 também dos homens e jovens.
Bom, finalizando, agora que sabemos a origem do melhor amigo do guarda-roupa feminino, basta usar o bom senso e não cair no lado do exagero com uma peça considerada tão perfeita. Vale a pena atentar para a dica da consultora brasileira de moda, Glorinha Kalil "do Rio de Janeiro para cima, o pretinho mantém a função de roupa elegante, mas em São Paulo, as mulheres extrapolam. Em uma manhã de sol, ver uma mulher toda de preto, é overdose. Sendo assim, num dia quente e ensolarado de verão, busque no armário algo colorido, ou branco, que combine com a estação, é claro. Bastará o termômetro cair 3, 4, 5 graus e pronto, está liberado o uso de nossos queridos e deliciosos pretinhos".

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